Doria e o futuro dos não políticos no Brasil
julho 11, 2017Doria e o futuro dos não políticos no Brasil
Primeiro candidato a vencer o cargo de prefeito em primeiro turno em SP desde 1992, João Doria, do PSDB, recebeu 53,29% dos votos válidos na cidade. Desde o início da campanha política, Doria adotou o discurso do “não político”, no entanto, de acordo com os especialistas esse tipo de posicionamento é equivocado, ainda que muitos candidatos já adotem esse discurso para tentar serem eleitos no próximo pleito.
“Não dá para dizer: sou gestor e empresário, não sou político, pois para ser político, basta entrar na disputa. Precisa fazer concessões para ter aliados, dentre outras coisas do jogo”, explica Marco Antonio Teixeira, vice-coordenador da gradução em Administração Pública da FGV EAESP (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas).
Na visão de Teixeira, já tem muitos empresários que desejam uma vida política adotando esse discurso e a popularidade de Doria auxilia muito para que os “não políticos” permaneçam nas eleições. “A medida que o discurso passa a ter um apelo positivo nas eleições, o marketing político passa a adotá-la, vai atrás e incorpora”, explica Teixeira.
De acordo com a pesquisa do Instituto Paraná, o prefeito de São Paulo superaria o ex-presidente Lula (PT) nas eleições. Além de sua gestão ter sido aprovada por 70% da população.
No entanto, caso a gestão de Doria sofra uma queda de popularidade muito grande, o discurso pode ser revisto. “Quando acontece algo grave há a possibilidade de afetar esse tipo de discurso negativamente. Mas isso independe do candidato, não é só o Doria. Para essa ‘classe política’ permanecer será preciso prestígio e reputação para permanecer na agenda”, diz.
Mas e por que negar a política atrai votos?
Na opinião de Teixeira, isso acontece, pois a palavra político está associada a adjetivos como ineficientes e corruptos. “Quando a pessoa usa um termo oposto de político, ela está querendo passar a ideia de idoneidade e eficiência. No entanto, assim que se entra para disputa, passa-se a fazer política. Se não fosse o apoio do Alckmin, por exemplo, talvez Doria não teria sido eleito”, explica o professor da FGV.
Para Paulo Silvino Ribeiro, docente da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), outro motivo dessa onda de descrédito seria a insatisfação, não só com a figura do político, mas também com as instituições. “Muita gente está descontente com o funcionamento do congresso e do poder executivo. Por isso, quando alguém se apresenta como gestor, as pessoas logo pensam que falta no governo a capacidade de administrar, de ser eficiente e eficaz, aí acabam optando por um plano B”, explica.
Outro ponto que Ribeiro destaca é que como apenas as corrupções que envolvem políticos são noticiadas, a população tem a falsa impressão de que os empresários não agem dessa maneira. “As pessoas tem a ideia de que quem não é político, não é corrupto, o que é um equívoco, também há corrupção na ordem privada”, fala.
Riscos da negação da política
Para Ribeiro, a negação da política é uma atitude perigosa por parte dos candidatos, pois isso é contraproducente para a democracia. “É como se estivéssemos tentando tratar alguém com um grave problema de saúde negando tudo que a ciência média avançou até hoje. A democracia é efetiva. Precisamos de uma reforma política, no sistema eleitoral, até para garantir mais espaços para as minorias e para que a sociedade civil tenha maior participação no Estado. A política do jeito que está é complicada, mas negá-la também não dá certo”, fala.
Segundo o professor da FESPSP, não há outro modo melhor de organizar a vida social do que pela via democrática e, ao negar a política, os políticos acabam tratando a sociedade como algo homogêneo.
“A sociedade é complexa e a negação da política acredita que é possível tratá-la de forma homogênea. A politicagem deve ser rechaçada, mas a política em sua origem é a preocupação com a vida na polis, vida em grupo, e isso não pode estar associada a administração de uma empresa. Uma companhia se der errado, pode ser fechada, já uma sociedade não. Ela tem um modus operandi dinâmico, que não é racional e nem coerente. A negação da política é um câncer para a democracia’, fala.
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