FHC usa adjetivo pelo qual fez embaixador dos EUA lhe pedir desculpas
junho 06, 2017FHC usa adjetivo pelo qual fez embaixador dos EUA lhe pedir desculpas
Fernando Henrique Cardoso, o príncipe da sociologia autóctone, nesse domingo brotou com seu tradicional artigo em dois grandes jornais. Chama a atenção o seguinte extrato:
Os políticos responsáveis sabem que qualquer arranjo político deve considerar suas consequências para os 14 milhões de desempregados e, portanto, para o crescimento da economia. Tampouco devem esquecer-se de que a população está indignada com a corrupção sistêmica que atingiu os partidos, o governo e parte das empresas. Portanto, chegou a hora de buscar o mínimo denominador comum que fortaleça a democracia e represente um desafogo para o povo, aflito com a falta de emprego e de renda. E indignado com a roubalheira.
Atentem para os vocábulos “corrupção sistêmica”.
O termo não é de FHC. É de Sérgio Moro, que em agosto do ano passado disse:
“É um quadro desalentador, um quadro de corrupção sistêmica, que é mais preocupante, porque envolve pagamento de propina como algo rotineiro e natural. Estamos falando em números superlativos, pagos aos milhões de reais. E o lado mais perturbador é que eram direcionados não só a agentes da Petrobras, mas a agentes políticos e partidos”.
O que mais chama a atenção: quando os EUA empregaram adjetivos similares, sob seu governo, o então presidente FHC exigiu desculpas do governo “estadounidense”, no expletivo tão amado pelas nossas esquerdas.
Esses vocábulos “estadounidenses” brotaram duas vezes no cenário gringo
A primeira vez foi em outubro de 1997, bem no ano em que o ex-presidente FHC privatizava a Vale do Rio Doce.
Bill Clinton preparava uma visita ao Brasil em outubro de 1997. O Departamento do Comércio dos EUA elaborou então um relatório, entregue ao grupo de empresários norte-americanos, que acompanharia a visita do presidente Bill Clinton ao Brasil. O dossiê estabelecia que havia “um excelente potencial de negócios no Brasil, mas aqui a corrupção ainda é endêmica na cultura brasileira”.
Causou mal-estar geral no governo de FHC.
O então embaixador norte-americano no Brasil, Melvyn Levitsky, teve de telefonar ao chanceler brasileiro, Luiz Felipe Lampreia, para desculpar-se pelo relatório em que o Brasil era citado.
Segundo o relatório, o Brasil era então o 15º num ranking de países mais corruptos do mundo, num estudo elaborado pela organização não-governamental alemã Transparency International.
Face o mal-estar, o Departamento de Estado norte-americano decidiu substituir a expressão “corrupção endêmica” por apenas “corrupção”.
Mas estavam certos em defini-la como “endêmica”.
Agora vamos a outra situação, mais recente ainda.
Um dos telegramas confidenciais enviados pela embaixada dos Estados Unidos no Brasil para Washington, e divulgados pelo Wikileaks, definia que as instituições brasileiras eram todas afetadas por “corrupção generalizada”.
O documento (leia a íntegra, em inglês), datado de 19 de fevereiro de 2009, foi enviado pelo embaixador americano no Brasil, Thomas Shannon, ao procurador-geral dos Estados Unidos, Eric Holder —antes deste visitar o Brasil entre 23 e 26 de fevereiro daquele ano.
Shannon escreveu:
“Apesar de muitos juristas serem de alto nível, o sistema judiciário brasileiro é frequentemente descrito como disfuncional e afetado por jurisdições que se sobrepõe, falta de treinamento, burocracia absurda e acúmulos [de processos] esmagadores. A corrupção persistente e generalizada afeta os três poderes do governo [Executivo, Legislativo e Judiciário]. A aptidão das forças da ordem são afetadas por falta de treinamento, rivalidades burocráticas, corrupção em algumas agências e as forças policiais são muito pequenas para cobrir um país de quase 200 milhões de habitantes”.
Causou mal-estar com Lula. Tiveram de se desculpar de novo. Mas estavam certos.
Desde que Kennedy criou em 1961 a Aliança para o Progresso, nossos comunas distorceram tudo. Passaram a dizer que a ajuda econômica dos EUA era na verdade uma forma de ataque consumada no Movimento de 1964. E que aquilo a que Lincoln Gordon (embaixador dos Estados Unidos no Brasil entre 1961 e 1966) chamava de ”Ilhas de Sanidade Administrativa” se referia, em verdade, mais à interferência política do que a ajuda econômica.
Não importa. 50 anos depois não somos nenhuma ilha de sanidade: muito menos administrativa.
Ao resgatar esses episódios, o blogueiro se lembrou de Alvaro Obregon, que presidiu o México entre 1920 e 1924. Seu bordão de governo era “eu roubo menos”. E, quando falava isso, exibia o cotoco: havia perdido meio braço num atentado a bomba que sofreu de seu segurança particular.
Não se iluda: quem vier ao poder, direta ou indiretamente, vai roubar: roubar menos, que seja, como estabeleceu Obregon.
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